Carlos Lopes está doente e esquecido pelos amigos: “O país não te esquecerá”

Carlos Lopes está doente e esquecido pelos amigos: "O país não te esquecerá"

Luís Osório escreveu uma carta aberta a Carlos Lopes, um dos maiores desportistas portugueses, que está agora a viver um momento difícil.

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Carlos Lopes, agora com 75 anos, foi um dos maiores desportistas portugueses, após se tornar campeão olímpico e mundial e levar o nome de Portugal além-fronteiras, a todos os cantos do mundo.

Há alguns anos, qualquer português sabia quem era Carlos Lopes, mas agora que o ex-atleta tem mais idade e está doente, nem os amigos querem saber de si.

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Foi com isto em mente que o escritor Luís Osório escolheu escrever-lhe uma carta aberta, para que Carlos Lopes nunca se esqueça dos seus feitos e do seu lugar no coração dos portugueses.

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“Caro Carlos Lopes. Sei que estás doente, que te é difícil sair de casa, que de quando em vez ficas triste pelo esquecimento do país, de alguns amigos que julgavas serem amigos, coisas que antes não te passavam pela cabeça.

Desculpa tratar-te por tu. Acredita que não é por falta de respeito, muito pelo contrário. É mais por uma ideia de pertença, por um sentido talvez desajustado de proximidade, afinal és um dos maiores portugueses da história do desporto.

Como tu, talvez Eusébio e Cristiano Ronaldo. Talvez Rosa Mota. Pouco mais.

Escrevo-te este postal para te dizer que não te esqueço. E como eu milhares de portugueses. Talvez até milhões que não se esquecem o que fizeste e o que és – sabes bem que uma coisa e a outra não estão necessariamente ligadas.

O que fizeste é esmagador. Campeão olímpico da maratona. Campeão mundial e europeu. Dezenas de medalhas e tantos elogios ao que foste na pista, na estrada, no corta-mato.

O país parava para te ver correr. Para gritar por ti. E sabíamos que não falhavas nos momentos decisivos, o teu espírito era inquebrantável, eras duro de roer, o mais completo atleta da história do atletismo até ao momento em que decidiste que terminava.

Foste o último dos europeus a fazer frente à ascensão dos grandes atletas africanos nas provas de resistência. Ias para as maratonas e ganhavas a quenianos, etíopes e marroquinos. O recorde mundial da maratona foi teu durante vários anos.

Mas se aquilo que fizeste é importante, o que sempre foste é-o ainda mais. Porque és uma parte do que somos enquanto país. Vieste do povo e nunca te tentaste pôr em bicos dos pés. Nunca maltrataste ninguém por sentires que o peso das medalhas to permitiria. Nunca deixaste de ser humilde, de comer nas tascas, de substituíres os teus amigos de sempre por novos amigos.

As vitórias não te afastaram das raízes. Simplesmente tentaste fazer o melhor possível tendo a memória dos que amaste, de onde vieste, do sofrimento que te fez mais forte. É por tudo isso que o teu nome se confunde com uma parte do país que somos.

Um país de gente boa, de gente de antes quebrar que torcer, de gente capaz de comer o pão que o diabo amassou sem perder a capacidade de acreditar no futuro, de fazer o melhor possível, de ser o melhor possível.

É verdade que digo muitas vezes que tudo isso deve ser temperado com uma arrogância positiva que por vezes nos falta, por uma exigência de conhecimento, por uma preparação académica e por um cosmopolitismo que não nos sobra enquanto povo.

Mas tu foste enorme num outro tempo. Um tempo de dificuldades. Um tempo até de conformismo porque não ganhávamos nada, só no hóquei em patins que nunca foi um desporto praticado pelo mundo.

Tu foste o nosso primeiro campeão olímpico. Correste com os melhores do mundo e ganhaste. E enquanto os melhores do mundo treinavam em altitude e tinham todas as condições, tu corrias na segunda circular e até foste atropelado uns dias antes da glória olímpica.

Foste o primeiro, Carlos. Quando os portugueses eram apenas os que faziam bem o trabalho que mais ninguém desejava fazer, levaste-nos a acreditar que podíamos ser e fazer como os melhores do mundo.

Ofereceste-nos a matéria de que se faz o orgulho. Obrigado por isso, Carlos Lopes.

Sei que estás doente. Que raramente sais de casa. Que por vezes ficas triste. Não fiques. Estamos aqui. O país não te esquecerá”.

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