A carta aberta a Rui Nabeiro que está a varrer o país: “Um homem invulgar que tive o prazer e a honra de conhecer e com quem conversei várias horas”

A carta aberta a Rui Nabeiro que está a varrer o país: "Um homem invulgar que tive o prazer e a honra de conhecer e com quem conversei várias horas"

O empresário Rui Nabeiro, fundador da Delta, faleceu no passado domingo, dia 19 de março, e Luís Osório dedicou-lhe o “Postal do Dia”.

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O escritor Luís Osório tem uma rubrica onde costuma celebrar as pessoas mais notáveis e que mereçam particular reconhecimento pelas suas ações ou pela forma de ser.

Desta vez, a morte de Rui Nabeiro inspirou Luís Osório a escrever sobre o fundador da Delta, numa homenagem que espelha bem o sentimento geral dos portugueses em relação ao empresário.

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“O café no paraíso ficou desde ontem por conta de Rui Nabeiro.

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Rui Nabeiro morreu no Dia do Pai. Dificilmente poderia ter escolhido um dia melhor para se ausentar o homem que nunca despediu ninguém.

O que até ao último dia da sua vida teve sempre pessoas que o esperavam à porta da sua casa ou à porta da empresa para lhe pedir ajuda, um conselho ou as duas coisas. E o senhor Rui, o senhor comendador, a ninguém dizia que não.

Quando algum trabalhador se portava mal, chamava-o e fazia-lhe ver a razão da sua desilusão. Sabia o nome de todos e de todas, sabia o nome dos filhos e dos pais e das mães dos que nas fábricas, nas vendas ou na parte administrativa, defendiam o nome Delta como parte também de si próprios.

Ontem, Dia do Pai, houve lágrimas na terra. E no país também. Morreu um dos melhores portugueses. Um homem invulgar que tive o prazer e a honra de conhecer e com quem conversei várias horas. Um homem admirável. Sempre preocupado com os outros.

Sempre preocupado com a sua terra, um lugar que sem ele estaria condenado ao desemprego, à ausência de sonho e à dificuldade do caminho.

Sempre preocupado em inovar, em não estar contentinho com o que ia atingindo, sempre preocupado com objetivos mais altos mesmo quando parecia condenado como os seus amigos de juventude a uma malga de sopa de pão ao jantar. Do nada fez um império.

O senhor Rui a quem apenas a madrinha de batizado levava um brinquedo no Natal. Um brinquedo que depois substituiu por uma nota de vinte escudos muito embrulhadinha que ele desembrulhava na esperança de serem duas. Ou na ideia de que talvez fosse uma surpresa maior se fechasse os olhos e pedisse com muita força.

Rui Nabeiro que cresceu a ver o esforço dos pais, as canseiras dos objetivos que nunca chegavam a ser concretizados. O sonho do pai era ter um carrinho seu, o que nunca aconteceu.

Quem sabe se não foi isso que o revoltou, que o mobilizou, que lhe deu forças para arriscar, ousar, ir em frente. E ganhar.

Rui Nabeiro morreu aos 91 anos, quase 92. Faltava uma semana apenas. Tinha imensa pena por ter de ir embora daqui. Continuava a ter curiosidade sobre a vida. Continuava a gostar de café. E de pessoas. Não era como a maioria dos outros. Era como ele próprio, foi sempre dele próprio. Ele e as suas convicções, ele e a sua força, ele e a sua generosidade.

Num tempo de feroz individualismo em que celebramos sempre vencedores que não dão nada aos outros, podemos por fim aplaudir um homem que construiu um império partilhando e oferecendo à terra que o viu nascer uma hipótese de não ser deserto.

O meu, e certamente que o teu também, profundo agradecimento, ao senhor Rui.

Ontem, Dia do Pai, dia em que o senhor partiu, ouviram-se anjos e querubins. Certamente que o vieram buscar e o levaram em primeira classe para o paraíso onde agora o café estará por sua conta”.

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